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Filosofia Contemporânea

Ary Raysford e a teoria integral de Ken Wilber

Pesquisador do Massachusetts Institute of Technology discute a influência do pensador norte-americano nos estudos de entendimento da modernidade
Bruno Torres
27/09/19

Seria possível fazer um levantamento de tudo o que já fizemos no planeta? Para Ari Raynsford, sim. Em seu trabalho como pesquisador, ele quer criar um "mapa de funcionamento do ser humano". Baseado na teoria integral de Ken Wilber, Raysford, que é doutor em engenharia nuclear pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), pretende compreender de maneira completa a evolução e as ações do homem na Terra.

Segundo Raynsford, a teoria integral de Wilber pode fornecer ferramentas para uma vida melhor. Para o pesquisador, nós devemos aprender a utilizar todas as tradições para ter mais equilíbrio no nosso cotidiano. Ficar apegado apenas à ciência ou a uma tradição milenar pode limitar nossas opções. Raynsford acredita que nós devemos aprender a utilizar o que cada uma dessas áreas pode oferecer de melhor para nossas vidas. A teoria integral pretende olhar para tudo e retirar o que há de melhor em cada ramo de conhecimento.

Os diferentes pontos de vistas de pensadores ocidentais e orientais inspiraram Wilber na missão de estudar um campo ainda inexplorado do conhecimento, explica Raysford. "Essa teoria é o trabalho de vida desse pensador americano, que começou aos 18 anos de idade e continua até os dias de hoje. Ele era um aluno brilhante que estava na faculdade e teve um insight ao ler o livro Tao Te King, do Lao Tsé. Isso fez com que ele se deparasse com um mundo totalmente novo, que é o ser humano, e resolveu se dedicar a isso", conta Raysford.

O trabalho de Wilber está fundamentado na integração de todo o conhecimento produzido pelo homem, representado por um mapa. "Uma vez que você entende esse mapa, há a possibilidade de conhecer as múltiplas visões para solucionar as questões e problemas diários".

Segundo Raynsford, a compreensão do mundo nos séculos passados foi embasada em três correntes: cartesiano, newtoniano e darwiniano. "Esse sistema funcionava e o homem não se deu conta de como cada um deles influenciou a nossa maneira de viver e de ver o mundo. Já foi algo maravilhoso, mas agora não funciona mais, pois os problemas se tornaram mais complexos e esse modo de vida precisa ser atualizado", alerta o pesquisador.

Em entrevista ao Portal NAMU, Raynsford esclarece a teoria de Wilber e suas aplicações. Também discorre sobre como é fundamental compreender o maior leque possível de opiniões em prol da evolução.

A beleza da natureza, da obra divina é essa dinâmica que faz com que a gente esteja sempre em busca de algo novo, algo melhor, algo maior, mais ordenado, mas ao mesmo tempo criando problemas mais complexos. Se resolvêssemos todos os problemas, iriamos viver aquela visão do paraíso.

Como se deu a formação da teoria da vida integral de Ken Wilber?
Se eu quero conhecer o ser humano, o caminho que eu vou seguir é tentar conhecê-lo através de todo o conhecimento que ele produziu seja na área da ciência, filosofia, artes ou da religiosidade. Essa é uma proposta extremamente ambiciosa que ele fez e está cumprindo até hoje. Wilber deu início a um estudo das escolas de psicologias ocidentais e das tradições da sabedoria oriental.

Por exemplo, ele estudou a psicanálise de Freud, a qual acredita que para você ser feliz é preciso fortalecer o seu ego. Em paralelo, ele estudava o budismo e Buda dizia que para encontrar a felicidade deve-se morrer para o seu ego. São propostas aparentemente antagônicas. Nesse ponto surge a genialidade do Wilber. A linha mestra do pensamento dele: eu não posso aceitar que tanto Freud como Buda, que são dois lideres iluminados da humanidade, possam ter errado totalmente.

E como essa dualidade se aplica dentro da teoria?
A maneira dele pensar está representada pela ideia de que todo mundo está parcialmente certo. Todas as verdades são parciais. Então, tudo que o ser humano gerou em termos de conhecimento em seu sentido mais amplo, é uma verdade parcial. A proposta que ele fez foi exatamente fazer a integração, como se essas verdades parciais fossem peças de um quebra-cabeça. Se você conseguir formar esse quebra-cabeça terá uma verdade ainda parcial, mas muito mais abrangente.

Como aplicar esses conceitos de maneira simples em nosso dia a dia?
De maneira bem simples, a teoria integral é um mapa do ser humano. É uma maneira que ele conseguiu dizer: cada um tem dentro de si um sistema operacional. Fazendo uma analogia com a informática: o que é o viver? Temos os inputs vindos de fora, as informações, sentimentos e eventos. Recebemos isso, processamos dentro de nós e produzimos estímulos que saem com um output sob a forma de pensamentos, ações, emoções e tudo mais. Essa é uma forma simples de fazermos uma metáfora do viver. Mas nós não conhecemos esse sistema a fundo, não sabemos como funcionamos. A teoria vem com a proposta de ser um mapa para compreender esse funcionamento. A função dela é simplesmente nos ajudar. Uma vez que você entende esse mapa, terá a possibilidade de ver as múltiplas formas de melhorar seu relacionamento com o mundo. Mas não é uma receita de bolo, é uma teoria com proposta de prática.

Como compreender o conhecimento dentro dessa filosofia?
Marcelo Gleiser no filme Eu Maior faz uma metáfora interessante do conhecimento e diz que se trata de uma ilha onde formada pela fronteira do que você conhece e do que desconhece. Quando aumentamos o conhecimento, a fronteira também aumenta. Esse conhecimento não é apenas o conhecimento cognitivo, apenas o conhecimento acadêmico. É o conhecimento na sua forma mais abrangente, conhecimento espiritual, um conhecimento nas artes, tudo aquilo que de alguma forma ajuda o ser humano a evoluir.

O que fazer para ampliar o conhecimento humano com relação ao universo e aos demais seres vivos?
O ser humano como conhecemos hoje tem 30 mil anos. Ou seja, levamos todo esse tempo para chegar a realidade que a humanidade vive hoje. E o que vemos hoje é esse enorme desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Porém, de certa maneira, temos pouco desenvolvimento espiritual. Agora, estamos passando por um período da humanidade que chamo de sui genesis, que nunca aconteceu.

Como a humanidade pode lidar com esse processo evolutivo e aprender a crescer a partir do conhecimento adquirido?
Pela primeira vez estamos nos dando conta disso, de que existe uma evolução. E o homem começa a ter a capacidade de tentar explicar essa evolução. Isso é fabuloso. Agora o ser humano que evoluiu nos últimos 30 mil anos, chegou a um patamar de consciência que ele tem a possibilidade de alterar os caminhos dessa evolução. Essa é a nossa responsabilidade. Agora nós temos a possibilidade de proteger ou destruir a natureza. Nós agora temos essa capacidade. Isso tem um lado maravilhoso, que dá um sentido pra vida, já que cada um de nós tem uma responsabilidade com relação a evolução. No entanto, há também um lado negativo. Se nós formos irresponsáveis vamos atrapalhar essa evolução. Nunca aconteceu isso antes na história da humanidade. Por isso, amarrando com a teoria integral, é importante você saber que se você tem essa importância. Eu não posso tudo, mas podemos, temos o livre arbítrio, mas temos uma infinidade de outras coisas que nos influenciam e agora temos a capacidade de tentar escolher os melhores caminhos. Mas não podemos fazer tudo. Agora que você tem essa “responsabilidade” em relação ao futuro, a você, a sua família, aos seus descendentes, a Terra em geral, em relação ao universo, a teoria integral está dando uma ajuda. Algo como: “olha, vou te ensinar como você funciona, porque se você souber disso, saber como é seu sistema operacional, isso vai facilitar a sua vida".

Foto: Vanessa Cancian 


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